The Vampire Lovers - 1970
“Esse é meu relato dos temíveis Karnsteins. Diante de Deus talvez sejamos poupados desses acontecimentos sobrenaturais novamente.” Joachim von Hartog Na história do cinema de horror, e mais especificamente enfocando o tema do vampirismo, o livro do irlandês Bram Stoker (1847 / 1912), “Drácula”, escrito em 1897, foi o escolhido como base para uma infinidade de filmes, sendo uma das obras literárias mais filmadas em todos os tempos, e envolvendo principalmente homens sugadores de sangue. Porém, um outro romance chamado “Carmilla”, escrito pelo igualmente irlandês Sheridan Le Fanu (1814 / 1873) num período ainda anterior, em 1871, e que influenciou a obra de Stoker, apresentava sensuais, sedutoras, belas e provocantes vampiras em seu argumento básico, sendo também bastante utilizado pelo cinema em vários filmes interessantes, onde entre eles destaca-se a famosa “trilogia Karnstein”, produzida no início da década de 1970 pela nostálgica produtora inglesa “Hammer”. Nessa época, o ciclo de filmes do vampiro Drácula (interpretado magistralmente por Christopher Lee) estava se desgastando numa mostra clara de decadência, obrigando a “Hammer” a procurar alternativas que mantivessem o interesse do público e consequentemente a saúde financeira da empresa, afinal fazer “cinema” é considerado pelos executivos acima de tudo um “negócio” que precisa gerar lucros para manter sua sobrevivência e continuidade. A citada trilogia inicia uma nova fase do estúdio, considerada bastante ousada por mostrar pela primeira vez o erotismo de belas mulheres vampiras semi nuas em cenas de lesbianismo, sendo por isso mesmo motivo de um maior patrulhamento pela censura da época. Em 1970, a “Hammer” fez uma parceria com o estúdio americano “American International”, e juntos produziram um único filme que é considerado um dos principais a explorar o universo ficcional da obra de Le Fanu, “Camilla, a Vampira de Karnstein” (The Vampire Lovers), dirigido por Roy Ward Baker e com Peter Cushing e a bela Ingrid Pitt. No ano seguinte, vieram as duas outras produções da trilogia, “Luxúria de Vampiros” (Lust For a Vampire, de Jimmy Sangster), com Yutte Stensgaard, e “As Filhas de Drácula” (Twins of Evil, de John Hough), com as gêmeas Madeleine e Mary Collinson e o sempre presente Peter Cushing. Apresentando todos aqueles elementos góticos característicos dos filmes da “Hammer”, como os imponentes castelos, a floresta fantasmagórica, os túmulos envoltos numa névoa sinistra, uma família atormentada por uma maldição, e acrescentando um significativa dose de erotismo e sensualidade com a nudez de belas mulheres, a história se inicia com o Barão Joachim von Hartog (Douglas Wilmer), um caçador de vampiros em busca de vingança pela morte de sua irmã, preparando uma armadilha no temível Castelo de Karnstein, onde uma família amaldiçoada de vampiros repousa em suas tumbas frias saindo apenas à noite em busca de alimento, o sangue dos aldeões de um vilarejo próximo. Quando uma jovem e bela vampira retorna de sua caçada, é surpreendida por Hartog que se apossa de seu manto, evitando que a criatura da noite possa voltar ao túmulo novamente. Incitando a vampira para um confronto, Hartog a mata através de decapitação, um dos poucos meios possíveis de se destruir um vampiro, e num trabalho exaustivo consegue eliminar os outros familiares em suas covas, cravando-lhes estacas de madeiras nos corações. Porém, o túmulo da bela Mircalla Karnstein (1522 / 1546) estava escondido num local seguro e não foi violado, permitindo que ela possa ressurgir para continuar o legado maldito de sua família em busca de sangue. A ação volta-se agora para uma festa no castelo do general von Spielsdorf (o aristocrático Peter Cushing), que recebe a visita de uma condessa da região (Dawn Addams), com sua bela filha Marcilla (Ingrid Pitt), que se hospeda no castelo e inicia seus planos de sedução com a jovem sobrinha do general, Laura (Pippa Steele), de quem quer o prazer sexual e o sangue jovem. O namorado da moça e administrador da propriedade, Carl Ebhardt (Jon Finch), não foi capaz de evitar a morte de Laura em condições misteriosas (fraqueza progressiva, em meio ao tormento de horríveis pesadelos), e que coincidiram com o desaparecimento de Marcilla. A vampira reaparece novamente com um nome alternativo, Carmilla, e como hóspede de uma outra mansão nas redondezas, pertencente ao Sr. Roger Morton (George Cole), que vive com a filha Emma (Madeline Smith) sob os cuidados da governanta Srta. Perrodot (Kate O´Mara), que por sua vez divide a administração do local com o capataz Sr. Renton (Harvey Hall). Esses últimos acabam seduzidos pelos encantos profanos de Carmilla, tornando-se as novas vítimas da ancestral criatura da noite. E para evitar a morte iminente da jovem Emma, em circunstâncias igualmente misteriosas como o de Laura, seu pai une-se ao general von Spielsdorf e ao Barão Hartog para juntos enfrentarem a vampira num confronto mortal em seu próprio lar de origem, no Castelo de Karnstein. Curiosamente, o ator que interpretou um médico em “Carmilla”, e eventualmente transformando-se em outra vítima das garras da sensual vampira, é o veterano Ferdy Mayne, o mesmo que encarnou o Conde Von Krolock, um aristocrático vampiro na clássica comédia de Roman Polanski “A Dança dos Vampiros” (Dance of the Vampires, 67). É impressionante como o ator tem um rosto e postura perfeitamente associados a uma figura de vampiro. Outro detalhe curioso é a sinistra presença em alguns momentos do filme, de um homem misterioso vestindo uma grande capa (o ator John Forbes-Robertson) creditado apenas como “Homem de Preto”, e que aparece sem dizer uma única palavra demonstrando ser um vampiro e de possuir alguma relação com Carmilla. Em Novembro de 2002, “Carmilla, a Vampira de Karnstein” foi lançado no Brasil em DVD pela revista “Dark Side DVD” ano 1 número 2, com distribuição em bancas e um preço popular. Infelizmente houveram algumas falhas notáveis, começando pelo título que o filme recebeu, o qual deveria ser “Os Amantes Vampiros”, numa tradução literal do original “The Vampire Lovers”. A qualidade da imagem está apenas razoável, e como material extra veio somente um pequeno trailer de 30 segundos e sem legendas, anunciado de forma equivocada no menu interativo como sendo de “Drácula, o Príncipe das Trevas” (66), quando o correto é “Drácula no Mundo da Mini Saia” (Dracula A.D. 1972). O cineasta inglês Roy Ward Baker nasceu em 1916 em Londres. Sua filmografia com quase 60 trabalhos tem como destaque os filmes de horror e ficção científica da “Hammer”, como “Uma Sepultura na Eternidade” (67), “Gangsters na Lua” (69), “O Conde Drácula” (70), “O Médico e a Irmã Monstro” (71), este baseado no famoso livro de Robert Louis Stevenson, e “A Lenda dos Sete Vampiros” (74), um dos últimos trabalhos da produtora, que encerrou as atividades poucos anos depois. O diretor participou também da rival “Amicus”, dirigindo as antologias “Asilo Sinistro” (72), com histórias de Robert Bloch, e “A Cripta dos Sonhos” (73). O elenco de “Carmilla, a Vampira de Karnstein” é formado por dois nomes especiais que tiveram fortes ligações com o horror em suas carreiras, o inglês Peter Cushing e a bela polonesa Ingrid Pitt. Cushing (1913 / 1994) teve uma carreira notável com aproximadamente 130 filmes, boa parte deles voltados para o gênero fantástico interpretando “cientistas loucos” ou nobres aristocráticos. Recebeu dos fãs e críticos o merecido título de “Cavalheiro do Horror” e ficou eternamente conhecido como o lendário caçador de vampiros Prof. Van Helsing ou pelo papel do cientista Dr. Frankenstein, numa enorme série de filmes significativos. Já a atriz Ingrid Pitt nasceu em 1937 na Polônia, e certamente está entre as mais efetivas e sensuais vampiras da história do cinema, interpretando entre outras, a sanguinária Carmilla / Marcilla / Mircalla da “Hammer”, vários interessantes anagramas da lendária vampira do escritor Le Fanu. Ela também participou de algumas outras produções do gênero destacando-se “A Condessa Drácula” (71), no papel da impiedosa Condessa Elisabeth Nodosheen, numa referência à histórica personagem real Condessa Bathory, que no século XVII se banhava de sangue humano com o insano pretexto de rejuvenescimento. Outros filmes importantes em que atuou foram a clássica antologia “A Casa Que Pingava Sangue” (The House That Dripped Blood, 70, “Amicus”), “O Homem de Palha” (The Wicker Man, 73), ao lado de Christopher Lee, e “Underworld” (85), com roteiro de Clive Barker. Recentemente ela pode ser vista num divertido curta metragem inglês de apenas 20 minutos chamado “Dedos Verdes” (Green Fingers, 2000), com direção de Paul Cotgrove, produzido com a intenção de homenagear os filmes da “Hammer”, e exibido no “14º Festival Internacional de Curtas-Metragens de São Paulo, Especial Horror, Categoria Mondo / Thriller”, em 31/08/2003. Carmilla, a Vampira de Karnstein (The Vampire Lovers, Inglaterra, 1970). Hammer Films / American International Pictures. Duração: 91 minutos. Direção de Roy Ward Baker. Roteiro de Tudor Gates, com adaptação de Harry Fine, Tudor Gates e Michael Style, da obra “Carmilla”, de Joseph Sheridan Le Fanu. Produção de Harry Fine e Michael Style. Música de Harry Robinson. Fotografia de Moray Grant. Edição de James Needs. Direção de Arte de Scott MacGregor. Elenco: Peter Cushing (General von Spielsdorf), Ingrid Pitt (Carmilla / Marcilla / Mircalla), Pippa Steele (Laura), Madeleine Smith (Emma Morton), George Cole (Roger Morton), Dawn Addams (Condessa), Jon Finch (Carl Ebhardt), Kate O´Mara (Srta. Perrodot), Douglas Wilmer (Barão Hartog), Harvey Hall (Renton), Kirsten Betts, John Forbes-Robertson, Charles Farrell, Janet Key, Shelagh Wilcocks, Graham James, Tom Browne.
Publicado originalmente no blog Juvenatrix Data: 09/12/05