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Il Profumo della Signora in Nero - 1974


Ah, esses italianos malucos e seus gialli surtados. Se os filmes de mistério à italiana são muitas vezes confusos e surreais (muitas vezes até involuntariamente), talvez esse exemplar atípico seja dos mais maravilhosamente esquisitos.


Silvia Harcheman (a boa atriz Mimsy Farmer) é uma jovem cientista industrial que vive sua vida pacata entre o trabalho e seu namoro com o misterioso Roberto (Maurizio Bonuglia), até que delírios envolvendo velhos traumas de infância arrastam a moça para um espiral de loucuras onde fantasia e realidade se misturam e se confundem. Seria ela vítima de uma conspiração movida por algum motivo obscuro? Ou seria alvo de algum feitiço? Ou tudo não passaria de surtos psicóticos? Afinal, quem seria a dama de preto que ela vê se perfumando em suas visões? E a enigmática garotinha loira que invade sua rotina? E que relação isto tudo tem haver com seus vizinhos, como por exemplo, a sua amiga Francesca (Donna Jordan) ou o bizarro Sr. Rossetti (Mario Scaccia), um ex-professor viúvo com fixações por hipopótamos? Sem se preocupar em responder de forma mastigadinha para o público estas e outras questões, o filme nos leva a um clima insano que desembocará numa conclusão simplesmente desconcertante e extrema.


O diretor Francisco Barilli, que já tinha trabalhado de roteirista (ajudou a escrever o clássico giallo “Chi I'ha Vista Morire?” a.k.a. “Who Saw Her Die?” - 1972 - de Aldo Lado) e ator (foi protagonista do clássico “Antes da Revolução” aka Prima Della Revoluzione, 1964, de Bernardo Bertolucci) e embora tenha dirigido alguns curtas e especiais para a tv, longas mesmo dirigiu apenas dois. Uma dupla de gialli peculiares pode-se dizer: Pensione Paura (1977) e este Il Profumo della Signora in Nero. Embora no universo do giallo a pergunta que habitualmente se faz é: "quem matou?", aqui a questão é outra: o espectador acaba se perguntando: "o que está acontecendo?" Neste ponto a obra de BARILLI se assemelha a outro giallo clássico, o alucinógeno Tutti Colori del Buio a.k.a. All Colors of the Dark (1972) do mestre Sergio Martino. Em ambos os filmes não há especificamente um assassino para ser descoberto, mas revelar se tudo que acontece faz parte de uma conspiração ou se é fruto da imaginação da personagem central. Ambos também bebem aparentemente na mesma fonte, a trilogia do apartamento de Roman Polanski, em especial O Bebê de Rosemary (notem que a Mia farrow e a Mimsy Farmer possuem o mesmo biotipo). Mas se em Tutti Colori del Buio Martino mergulha num clima delirante de psicodelia, Barelli opta aqui por um clima surreal mais gótico e menos linear. Outra curiosidade é que esse filme também se assemelha ao último filme da trilogia do apartamento: O Inquilino, já que a protagonista no desenrolar da obra vai assumindo outra personalidade, o detalhe é que o filme de Polanski foi realizado dois anos depois.

O filme começa de forma lenta o que pode desagradar a geração fast-food/video game atual, mas cresce em sua parte final quando não conseguimos mais definir o que é realidade e delírio (o que fez com que esse filme chegasse a ser chamado de "pré-David Lynch" por alguns). A fotografia de Mario Masini, como de praxe no cinema italiano é ótima, com alguns belos movimentos de câmera (como a cena de abertura) e a música de Nicola Piovani da o suporte necessário a este surto cinemático.


Embora seja um filme um tanto difícil, que pode não agradar a todos, Il Profumo della Signora in Nero é uma obra bela e desconcertante, uma gema obscura que merece ser descoberta. Uma autêntica peça de arte. Uma iguaria para paladares especiais.

Il Profumo della Signora in Nero/The Perfume of the Lady in Black (1974) Direção: Francisco Barilli Com: Mimsy Farmer, Maurizio Bonuglia, Aldo Valletti, Mario Scaccia, Donna Jordan.

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