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Society - 1989


As indizíveis criaturas do Inferno de Lovecraft devem estar se regozijando com as peripécias iniciais de seu filho bastardo Brian Yuzna. Entre as adaptações do escritor americano compartilhadas com seu parceiro Stuart Gordon, o cineasta filipino ainda deu vida a projetos próprios, tendo seu debut na direção em 1989 com Society. Antes de se perder em trabalhos irreconhecíveis como Querida, Encolhi as Crianças e Tarzan, Yuzna chegou a tocar o extremo com monstruosidades e ousadias, críticas sociais e horror indigesto ao se lançar no comando do roteiro de Rick Fry e Woody Keith, ambos de A Noiva do Re-Animator. Não fez um filme perfeito, mas uma excelente carta de apresentação, principalmente com a perturbadora sequência final que talvez tenha inspirado a VTI a apelidá-lo de A Sociedade dos Amigos do Diabo.


Tanto o título brasileiro quanto o original podem fazer um distraído imaginar de que se trata de um filme de seita maligna, com rituais de invocação do demônio e sacrifícios. Até existem encontros secretos e rituais bizarros, mas são apenas parte da rotina de uma rica sociedade que cospe nas faces imundas dos desprovidos financeiramente. Aliás, faz um pouco mais do que simplesmente cuspir. O conceito é bem mais simples do que se pode imaginar, ainda assim considerado por muitos como complicado e inacessível, tanto que os americanos só foram ver o filme em 1992, três anos após o lançamento na Europa, onde fez muito sucesso e trouxe retornos interessantes para o diretor.


Para fazer parte da tal Sociedade, é preciso ter a idade adequada e bons fundos. Nascer em berço de ouro pode lhe prover de bons momentos entre os iguais no sábado à noite, entre trocas de elogios e uma alimentação especial. Bill Whitney (Billy Warlock, de Baywatch) vive na beirada dessa sorte por sua condição bastarda. Embora seja popular nos esportes e na escola, onde disputa o cargo de presidente de turma, ele se sente um invasor dentro de sua própria morada. Não há diálogos, nem carinho ou atenção dos pais, numa preferência natural à irmã, algo que o conduz a consultas regulares e incompreensíveis com o psicólogo Dr. Cleveland (Ben Slack, de Assassinato em Primeiro Grau). Quando o ex-namorado de sua irmã, David Blanchard (Tim Bartell), começa a alertá-lo sobre coisas esquisitas que captou da família no debut da garota, num microfone escondido no brinco, Bill inicia sua descida às camadas do Inferno a cada descoberta.


Enquanto acidentes estranhos eliminam aqueles que tentam falar mal da Sociedade, Billy deixa de lado a namorada ciumenta e passa a ser envolver com a sedutora Clarissa (Devin DeVasquez), que possui na figura da mãe algo que já evidencia o gosto do diretor pelo bizarro. Ele ainda enxerta momentos peculiares como um banho da irmã, cujos seios aparecem nas costas, e a posição sexual que traria aplausos dos mais virtuosos contorcionistas. Yuzna parece estar homenageando o cinema de Cronemberg e fazendo referências ao trabalho de Paul Bartel no humor negro Tudo Por Dinheiro, de 1982, e a comédia Comendo os Ricos, de 87, dirigida por Peter Richardson. Imagine todos esses diretores sentados à mesa para uma refeição lovecraftiana e você compreenderá os últimos vinte minutos dessa obra-prima de Yuzna.


Indiferente ao conteúdo e às mensagens políticas, resta um último ato exagerado e extremamente perturbador. Num olhar atual, é fácil identificar as deficiências técnicas nos efeitos de maquiagem a cargo do experiente Screaming Mad George, seja nos bonecos de látex ou no tom avermelhado e artificial. No entanto, são alegorias que evidenciam uma sociedade feia e supérflua, e os ingredientes de um espetáculo obsceno de criaturas disformes em atos de orgia e canibalismo, com um humor que pode não ser bem digerido para os que não são íntimos com o extremo.


A Sociedade dos Amigos do Diabo é um pesadelo urbano. É o retrato dos insultos que sofrem os trabalhadores em seu ritual diário de humilhação por parte daqueles que captam seu suor diário e enchem piscinas e copos de cristal. Poderia ser o filme promissor de uma trajetória marcante na sociedade dos gênios do horror, mas acaba sendo um trabalho bastardo, idealista e repulsante, que encerra de maneira satisfatória a década de 80.

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