La Orgía de los Muertos - 1973
Quando o cinema é a representação máxima do entretenimento, surgem pérolas excêntricas e divertidas como o eurohorror La Orgía de los Muertos, lançada em 1973, com a direção de José Luis Merino, que também assina o roteiro em parceria de Enrico Colombo. Também conhecido como The Hanging Woman - e até Terror of the Living Dead ou Beyond The Living Dead -, a película atrai atenção inicialmente pela presença do ícone Paul Naschy, mesmo em papel secundário. É claro que uma mistura inusitada também é um convite à curiosidade: zumbis, bruxaria, necrofilia, maldição, cientista louco e vingança sobrenatural em um ambiente atmosférico, situado num vilarejo remoto com neblina densa, poucos habitantes e suas crenças e temores.
Nascido em 6 de setembro de 1934, em Madri, Paul Naschy sempre teve uma relação muito próxima com o horror. Cresceu como testemunha da Guerra Civil Espanhola, e teve sua primeira experiência no gênero quando assistiu aos 11 anos nos cinemas ao clássico Frankenstein Encontra o Lobisomem, de 1943. Em 67, escreveu o roteiro de La marca del Hombre-lobo, com a expectativa de que o lobisomem fosse interpretado pelo popular Lon Chaney Jr.. Quando o astro desistiu, sobrou para Naschy assumir o papel de Waldermar Daninsky, personagem que voltaria em mais de doze continuações, dando-lhe o apelido de "rei do horror espanhol", conforme menciona em sua autobiografia "Memoirs of a Wolfman". O ator faleceu em 30 de novembro de 2009, com uma filmografia belíssima com mais de 100 produções, incluindo o brasileiro Um Lobisomem na Amazônia, de 2005, de Ivan Cardoso.
Como na época das filmagens de La Orgía de los Muertos Naschy estava envolvido em mais oito filmes, ele teve que reduzir sua participação para mero coadjuvante, embora roube a atenção a cada cena que traz o sinistro necrófilo Igor. A trama se passa num vilarejo do século XIX, onde está ocorrendo o sepultamento do Conde Mihajli. Com sua partida, seu sobrinho Serge Chekov (Stelvio Rosi) chega ao local para reclamar sua parte na herança, ignorando os avisos para evitar perambular pelo cemitério à noite. Ao cruzar pelas velhas tumbas, ele tem uma visão pavorosa de uma mulher enforcada numa árvore, como o Padre Thomas do posterior Pavor na Cidade dos Zumbis, de Lucio Fulci.
Logo ele descobre que a tal falecida é sua prima, filha do Conde e primeira herdeira, o que lhe traria mais benefícios na herança com o suicídio pois nada fora deixado para a Condessa Nadia (Maria Pia Conte), praticante de Magia Negra. O detetive (Pasquale Basile) informa que a enforcada foi assassinada antes de ter sido colocada na árvore e que o próprio recém-chegado Serge é um dos suspeitos. Assim que se estabelece na mansão, o rapaz conhece mais suspeitos do assassinato como o - sempre culpado - mordomo, a ama Doris (Dyanik Zurakowska) e seu pai, o professor Leon Droila (Gérard Tichy, veterano ator de filmes como O Terror da Serra Elétrica e O Mistério da Ilha dos Monstros), cujas experiências com reanimação de animais mortos a partir de choques elétricos já permitem ao espectador antecipar os acontecimentos.
Entre os suspeitos também está, é claro, o coveiro Igor, um ladrão de corpos do cemitério para atos necrófilos. Sua paixão pelos cadáveres dificulta a relação com os vivos, mesmo quando a Condessa se finge de morta para uma aventura sexual. Quando ocorrem outros assassinatos, Igor passa a ser um dos procurados até deixar uma importante mensagem escrita a sangue "no37" para o espectador detetive tentar descobrir o que ele quis dizer. Como o título exploitation já revela, não se trata apenas de uma trama de suspense, inspirada no clássico gótico Kill Baby Kill, de Mario Bava. Há zumbis. Não comedores de carne humana, como George Romero apresentou ao cinema, mas em sua concepção original: aqueles que andam lentamente e sufocam suas vítimas até a morte.
La Orgía de los Muertos não está entre os melhores exemplares do eurohorror do período. Ainda assim há elementos interessantes como o clima gótico envolvendo um pequeno e misterioso vilarejo, com seu gigantesco cemitério, e a presença de mortos-vivos bem caracterizados, com maquiagem exagerada e olhos arregalados. O ambiente subterrâneo, escondido pelo cemitério, também é capaz de trazer arrepios no espectador, num labirinto escuro de cavernas e tumbas, que possivelmente serviu de inspiração para Romero em Dia dos Mortos. Apesar do baixo orçamento, José Luis Merino concebeu um trabalho seguro na direção, sem comprometer o conteúdo, driblando as dificuldades técnicas com criatividade. Ele já havia mostrado seu talento em conduzir tramas complexas em Il castello dalle porte di fuoco, de 70.
Além de Naschy e Gérard Tichy, uma atuação que se destaca é a da belíssima Dyanik Zurakowska, em seus momentos de desespero entre uma legião de mortos-vivos. Não é um mero acaso o encantamento de Serge pela garota, com sua atraente ingenuidade. A atriz depois seria vista com mais destaque em outra orgia, A Orgia Noturna dos Vampiros, terror fraquinho lançado no mesmo ano. A italiana Maria Pia Conte também está entre os colírios da produção. Já Stelvio Rosi, apesar da dubiedade de seu personagem, perde pontos pela estética promovida pelo corte de cabelo que tira toda a seriedade do herói Serge.
Independente da pequena participação de Paul Naschy, é ele que irá remeter à produção quando você vê-lo zumbificado, caminhando lentamente em direção a Serge, preso à cama, diante do discurso do vilão. Só isso já vale uma conferida e uma boa nota!