Necrophile Passion - 2013
Necrofilia, uma questão que tem uma pungência incomum, mas que atualmente (e curiosamente!) está fazendo parte tanto dos noticiários quanto da grande tela. Quando Jörg Buttgereit, em 1987, quebrou todos os tabus ao lançar o aclamado Nekromantik, um grito purulento saiu da carcaça moralista que dominava o cinema até então. Algumas anos depois, um novo diretor resolve criar uma nova história sobre esta estranha parafilia. Mas o que esperar de Necrophile Passion? Um simples remake de Nekromantik ou será que os limites do “bom gosto” serão ainda mais explorados?
Tom Heidenberg é o cérebro por trás deste trabalho ousado e desconhecido. A história começa inicialmente com um homem (Günther Brandl) que perdeu todo o sentido da vida e resolve clarear um pouco a mente caminhando por um bosque. Foi abandonado pela namorada e como consequência toda a sua vida foi roubada ao ponto de querer se suicidar, mas seus pensamentos são direcionados a uma estranha mancha entre os arbustos. Quando foi averiguar a estranha mancha branca qual não foi a sua surpresa ao se deparar com um corpo nu (e morto!) de uma garota. O homem chega a pensar em contatar a polícia local, mas algo no cadáver chama sua atenção e desejos enterrados em sua psique decidem que o melhor seria levar o corpo para sua casa. Daí em diante um carrossel de sensações se desenrola trazendo a tona a satisfação mórbida que os corpos mortos lhe oferecem enquanto flashbacks da vida do protagonista nos mostram qual foi a estrutura que moldou este bizarro caminho sem volta.
Em Necrophile Passion, o público se torna, aos poucos, apático como o personagem principal. Tenta a todo custo banir as sensações que invadem sua mente pelo vídeo e por várias vezes luta para escapar das imagens angustiantes, mas no final sempre será um voyeur que se sente tão corrupto quanto o corpo morto no qual o protagonista tenta satisfazer sua luxúria. Apesar de sua caracterização extremamente amadora este filme é um trabalho louvável, principalmente pelo fato do diretor não ter um currículo público apresentável na grande tela. Precisamente, o que faz Tom Heideberg com o seu trabalho de estreia é tentar arrancar do espectador o chão sob seus pés a partir das memórias do personagem principal tendo como ponto de partida a sua infância. E se você o observar com outros olhos, do abandono paterno aos acessos de raiva e insultos provindos de sua mãe, então não é de se surpreender que o protagonista tenha se tornado um ser tão monstruoso.
Mas o filme também tem seus maus momentos e não segue sempre como um mar de rosas. Günther Brandl, o ator que desempenha o papel de um homem letárgico, triste e preocupado, chega a cansar um pouco com suas caras e bocas no decorrer da película. As atrizes também não são as mais expressivas. Não é necessário ter ganhado um Oscar na Categoria Interpretação para fingir que está morto, mas as garotas pareciam estar em um sono tranquilo que em nada se assemelhava com a morte. Apesar do sangue em profusão e eventuais mutilações seus semblantes não continham a palidez e o esgar que toma os lábios dos seres humanos no momento da morte. Uma exceção digna de nota é a atuação de Eldrid Remy, que interpreta a namorada do personagem principal. Remy cultivou (especialmente nos espectadores do sexo masculino) uma raiva quase destrutiva ao interpretar uma estranha garota com desejos necro/sadomasoquistas que trata o protagonista como um grande fracassado sem perspectiva. O desprezo dela pelo namorado é tão grande que ela chega a compará-lo com um corpo morto… e lógico que ela acaba por escolher o morto para suas fantasias sexuais.
Sobre os aspectos técnicos do filme a música de René Bidmon dá ao filme um sabor todo especial. René, assim como Tom Heidenberg, faz sua estreia na grande tela com uma trilha incidental tão densa e perturbadora quanto a mente do protagonista. Os efeitos visuais e FX ficam à cargo de Thomas Binder, que também é responsável pela arte do pôster. Não vou dizer que os “props” utilizados são 100% convincentes, mas para uma produção alternativa os cadáveres “à la Nekromantik” não fizeram tão feio.
Finalmente, devemos dizer algo sobre o tempo de execução do filme, que dura cerca de 50 minutos. Pode parecer um pouco curto, mas como executá-lo com 20-30 minutos a mais sem ficar entediado? O desenrolar da trama foi desenvolvido com base nos resultados oriundos das imagens de pesadelo, divididas em seis pequenos capítulos onde o espectador se perde neste mundo, é capturado deleitando-se nas memórias do protagonista e apenas com a chegada dos créditos finais entende que o pesadelo acabou.
Necrophile Passion pode não ter a técnica e o profissionalismo de Nekromantik, mas tornou-se um trabalho vistoso como nenhum outro antes dele. Perturbador, pungente, cativante e simplesmente diferente. Para os fãs do cinema experimental e para todos aqueles que querem testar seus limites, este filme é uma necessidade absoluta!