Taste the Blood of Dracula - 1970
E Christopher Lee ostenta pela quarta vez a capa do mais notório dos vampiros nesta obra interessante e bem peculiar.
O filme começa quando um comerciante, chamado Weller (Roy Kinnear, da versão original de A Fantástica Fábrica de Chocolate, Help!, aquele com os Beatles, entre outros), voltando de uma viagem de negócios, se indispôs com um garoto com problemas mentais, que expulsa o mercador da carruagem em que viajam. Perdido na floresta, Weller acaba se deparando com Drácula agonizando, no exato momento em que o vampiro morre tal qual o final do filme anterior da série, Drácula, O Perfil do Diabo (aliás, reaproveitando cenas da obra anterior, obviamente). O comerciante assiste a decomposição do conde, com o sangue deste último se transformando em um pó vermelho. Entram os créditos do filme.
Corta agora para a Londres vitoriana, onde temos um grupo de jovens, onde já identificamos quem será a heroína indefesa da vez, a bela loura Alice Hargood (Linda Hayden, de The Blood on Satan’s Claw e Meninos do Brasil), e o herói é o namoro da moça, o impetuoso Paul Paxton (Anthonny Higgins, que depois faria Os Caçadores da Arca Pedida, O Enigma da Pirâmide, etc). Obviamente que William Hargood (Geoffrey Keen, que depois apareceria em meia dúzia de filmes do 007, no papel do ministro de defesa),o pai da moça, desaprova o romance da filha.
O velho Wiiliam Hargood tem como amigos o pai de Paul, Samuel Paxton (Peter Sallis, que ficaria famoso como dublador de Wallace, da série de animação Wallace & Grommit) e Jonathan Secker (John Carson de Epidemia de Zumbis, Captain Kronos – Vampire Hunter, entre outros). Este trio de respeitáveis cavalheiros veste o manto da moralidade e preservação dos bons costumes. Pura fachada. Sobre a imagem de respeitáveis filantropos, os velhacos não passam de sórdidos boêmios que frequentam secretamente um bordel que fica convenientemente escondido nos fundos de uma casa de caridade para pobres.
E no cabaré secreto que esses hipócritas vitorianos conhecem o jovem lorde Courtley (Ralpoh Bates, em seu primeiro dos cinco filmes que faria para a Hammer), um sinistro e romântico nobre, com ares de lorde Byron. Cansados de suas vidas medíocres e tediosas, o trio de senhores acata as promessas de Courtley, a de ganhar uma vida mais excitante. Para isso teriam que fazer um pacto com o diabo.
O lorde induz seus novos amigos a irem até uma igreja abandonada e decrépita para realizarem o ritual satânico, o qual utilizará inclusive as roupas e o sangue de Drácula, transformado em pó, que o grupo teria comprado do mesmo vendedor que vimos no prólogo. O jovem lorde acaba bebendo seu sangue misturado a cinzas de Drácula e enquanto passa mal, acaba sendo espancado pelo trio de senhores que foge o abandonando. Mais tarde, Courtley, num efeito maravilhosamente tosco e cafona, acaba se metamorfoseando em Drácula, ou seja, Ralph Bates se torna Christopher Lee!
O vampiro redivivo então promete se vingar matando o trio que abandonou o jovem servo das trevas. Para isso começa hipnotizando Alice, fazendo-a matar o próprio pai. Vingança se seguirá com o vampiro induzido filhos a assassinarem seus pais.
Ao contrário de As Noivas do Vampiro, que foi escrito para ser estrelado por Drácula, e depois acabou sendo retirado graças à recusa de Christopher Lee em volta ao papel do conde, O Sangue do Drácula era para ser um filme centrado na vingança do personagem de Ralph Bates. A Hammer não tinha mais planos para trabalhar com Lee, graças às exigências salariais cada vez maiores do astro. Tanto que a Hammer já tinha engatilhado outro filme de Drácula, com outro ator, e que não seguiria a cronologia da série. Porém, a Warner Seven Arts conseguiu convencer o ator a vestir a capa e os caninos do vampiro novamente. Para não perder essa oportunidade, rapidamente a Hammer não só reescreveu o roteiro, tornando-o a continuação de Drácula, O Perfil do Diabo, como também aproveitou o ator no outro projeto envolvendo o vampiro, que acabou se tornando Conde Drácula (Scars of Dracula). Sendo assim a produtora conseguiu engatar Lee em dois filmes do vampiro no mesmo ano.
Reza a lenda que Vincent Price teria sido cogitado para ser um quarto personagem do grupo de velhos burgueses sacanas, mas o ator acabou sendo cortado da produção, pela sempre inconveniente limitação orçamentária. O Sangue de Drácula marca o fim da ordem cronológica que a série mantinha até então, amarrando um filme no outro, depois acabaria apelando para o vale-tudo, em busca da bilheteria fácil.
Christopher Lee continua esbanjando seu charme canastrão, Ralph Bates constrói aqui a persona que adotaria nos filmes da Hammer, o do jovem arrogante. E tentem achar no final a atriz Madeleine Smith, que seria uma futura musa da Hammer, aqui em começo de carreira, por baixo de uma peruca loira, como uma das garotas do bordel. O roteiro de Anthony Hinds, que já tinha escrito Drácula, O Perfil do Diabo, possui elementos interessantes, como o romantismo byroniano, ao abordar temas como luxúria, tédio e satanismo, assim como elementos da tragédia grega como o parricídio, com filhos matando seus pais sobre influência de Drácula.
A direção ficou a cargo desta vez de Peter Sasdy, um imigrante húngaro que até então tinha feito trabalhos exclusivamente para a TV, aqui na sua estreia no cinema (depois ele faria para a Hammer uma interessante versão para Jack, o Estripador em As Mãos do Estripador). O diretor, embora não tenha o cuidado estético de seus predecessores da série (o mestre Terence Fisher e Freddie Francis), consegue aglutinar de forma interessante os subtemas peculiares do roteiro.
Claro que há falhas, tanto do roteiro quanto da execução, mas nada que comprometa seriamente a diversão. Talvez o deslize mais grave esteja em sua conclusão, um dos finais mais bobos da série. O Sangue de Drácula não tem a mesma excelência dos primeiros filmes da série, os dirigidos por Terence Fisher, mas é um dos mais interessantes.