Adamo ed Eva, la Prima Storia d’Amore - 1983
Quando você pensa que já viu de tudo, se depara com isto: uma delirante e bizarra aventura narrando a odisseia de Adão e Eva. Coisa que só poderia ter saído da cabeça de italianos malucos dos anos 80.
Esqueça algum rigor que a produção poderia ter em termos de fidelidade com as escrituras do Gênesis, o primeiro livro da Bíblia; o filme mete no mesmo balaio criacionismo, darwinismo e bizarrices. A obra começa com cenas de arquivos surrupiadas de outros filmes: terremotos, maremotos, explosões, erupções vulcânicas, tudo para mostrar o surgimento da terra. Logo emerge direto do solo uma criatura envolta em algo que parece uma placenta, com o rompimento da bolsa sai, em meio a algumas tripas, Adão, o primeiro homem (o péssimo canastrão Mark Gregory).
No Paraíso, Adão anda pelado em meio a belas paisagens, convivendo plenamente com os animais, mas aparentemente bate a solidão, e ele acaba esculpindo a imagem de uma mulher na areia da praia, começa a chover e do meio da areia surge Eva (a bonita Andrea Goldman, em seu único papel no cinema). É a primeira “licença poética” do filme, pela Bíblia ela deveria surgir da costela de Adão. E notem que Deus a criou partindo do boneco que Adão fez na areia, ou seja, aqui é o primeiro homem o criador do layout da primeira mulher.
Seguem mais cenas paradisíacas, muito bem fotografadas por sinal, em clima de videoclipe, com uma baladinha melosa chamada “My First love” para embalar o dia-a-dia dos dois.
Um dia Eva acorda do sono e assiste um leão e uma leoa em pleno acasalamento, o que parece ter ouriçado a moça, e também é outra “licença poética”, já que a rigor o sexo não existe no Paraíso. Tudo corre bem até Eva encontrar a árvore do fruto proibido, uma macieira, e ser tentada pela serpente. Como se não bastasse, a companheira de Adão está cansada de apenas dormir, tomar banho no rio e comer frutas, ou seja, está entediada com a rotina bucólica-idílica-vegana. Ela quer mudanças em sua vida. Então o casal cai na besteira de comer a maçã, e logo começam a transar, o efeito do pecado é imediato.
O tempo fecha e começa um vendaval no paraíso. O casal é enxotado de lá fugindo de uma pedra grande que rola atrás deles no melhor estilo “Os Caçadores da Arca Perdida”, só que aqui num efeito especial vergonhoso. Fora do paraíso, começa a jornada do casal por um mundo desconhecido e inóspito. Mortos de fome, eles encontram um ninho com ovos grandes, mal sabem que são de um pterodáctilo, e que irá ataca-los. Adão, então, numa atitude digna de Tarzan, mata o réptil alado com as próprias mãos, e, depois dos nossos heróis se deliciarem com as entranhas do animal ainda cru (o fogo até então não tinha sido descoberto), Eva aproveita o couro das asas do bicho para terminar seu vestuário – leia-se uma espécie de biquíni rústico.
Na próxima etapa eles acabam prisioneiros de um grupo de homens das cavernas. Sim, aqui teorias criacionistas e darwinistas convivem plenamente. Mas os tais homens pré-históricos se mostram mais medrosos do que selvagens, e nosso casal protagonista escapa deles sem maiores dificuldades. Depois de uma discussão de relação, resolvem se separar e cada um vai para um lado. Adão toma um rumo e Eva outro, nisto ela acaba prisioneira de uma tribo de selvagens que usam uma pintura verde no corpo. Um dos homens da tribo (o espanhol Ángel Alcázar) se apaixona por Eva e foge com ela. Enquanto vemos as imagens de Adão caminhando entra vales e planícies, temos o selvagem transando com Eva. Pois é, até para o Adão a fila anda.
A tribo dos selvagens é atacada por outra tribo, que pelas vexatórias máscaras simiescas e peles grossas na vestimenta devem ser uma tentativa de neandertais. Logo o novo companheiro de Eva volta com ela para ajudar sua tribo a massacrar os intrusos. Em meio a luta aparece Adão para dar uma mão. O trio acaba sobrevivendo e começam uma peregrinação sabe-se lá para onde, até que, num momento de descanso, Eva refresca os pés nas águas de um rio e acaba atacada por um urso (na verdade um cara enfiado numa das fantasias mais vergonhosas que já vi!), que acaba sendo morto pelo selvagem. Após isso Adão, num ataque de ciúmes, estragando o que poderia ser o primeiro menage-à-trois da humanidade, resolve disputar a mulher, e apanha uma sova e só não é morto por pedido de Eva, que acaba retornando para seu companheiro original.
Temos então o casal voltando a andar juntos. Daí o filme, na sua fase final, perde um pouco o ritmo, alternando cenas românticas com discussões do casal, até o final com o nascimento de Caim, o primeiro filho do casal.
Como podem notar a obra faz uma mistureba maluca, mesclando várias referencias da época, que vai de “A Lagoa azul”, “A Guerra do Fogo” até os filmes de canibais. O título lançado nos EUA, “Adam and Eve vs Cannibals”, não faz muito jus, apesar de alguma violência aqui e ali, ainda que muito mal feita, e o título origina italiano, “Adamo ed Eva, la Prima Storia d’Amore” também da uma ideia errada, de algo meloso. O filme também é conhecido como “Blue Paradise”, não confundir com “Paraíso Azul” (Paradise) de Stuart Gillard, uma imitação de “Lagoa azul” estrelada pela Phobe Cates que passava no sbt.
Não se pode negar que o roteiro episódico, creditado a nove pessoas, não é original em seu conceito. E que a dupla de diretores, Enzo Doria (aqui assinando com o pseudônimo de Vicent Green) e Luigi Russo (aqui como John Wilder) fizeram uma obra fascinante e ousada em sua tosquice e porralouquice.
Para quem esperar uma profusão de imagens de pintos e pererecas, lamento informar que nada aparece aqui, o filme é bem pudico quanto a isso; aliás esta é a grande mancada da obra: até os peitos da Eva mal parecem em cena. O canastrão Mark Gregory, ou Marco Di Gregorio, que é o seu nome de batismo, nascido em Roma em 1965, era vendedor de sapatos quanto foi descoberto numa academia de ginastica e entrou para o cinema, estreou em “1990 – Os Guerreiros do Bronx”, um mix maluco de “Mad Max” com “The Warriors” e “Fuga de Nova York“, depois fez a sequência “Fuga de Bronx”, ambos dirigidos por Enzo G. Castellari. Mark se destacaria ainda na trilogia “Thunder” aonde faz um índio que volta para a sua reserva e tem de enfrentar os caras pálidas locais, uma série visivelmente calcado no filme “Rambo- Programado Para Matar”. Ele participou de onze produções e desapareceu do cinema. Campanhas foram feitas para encontrá-lo. Parece que acharam ele, mas o homem não quer saber de conversa, muito menos sobre sua carreira cinematográfica.
Com toda a sua esquisitice, “Adamo ed Eva, la Prima Storia d’Amore” pode não ser uma grande obra, na verdade é uma tranqueira, mas prende sua atenção pelo inusitado da trama e não entedia. Uma heresia gostosa.
Adamo ed Eva, la Prima Storia d’Amore / Adam and Eve vs Cannibals / Blue Paradise
Itália - 1983
Direção: Enzo Doria e Luigi Russo
Com: Mark Gregory, Andrea Goldman, Ángel Alcázar.
Kommentare