Night of the Animated Dead - 2021
A obra absoluta de George Romero e John Russo está em domínio público desde suas primeiras exibições na tela grande, quando alteraram o título original Night of the Flesh Eaters para Night of the Living Dead sem colocar nos créditos os direitos autorais exigidos. Assim, qualquer pessoa pode fazer seu próprio A Noite dos Mortos-Vivos com a família e amigos, sem se preocupar em ter que dar explicações à justiça. Isso explica as inúmeras versões do filme, continuações bastardas e fanfics desenvolvidas a partir do material original. E explica a realização desta versão animada intitulada originalmente como Night of the Animated Dead e lançada com o péssimo título nacional O Ataque dos Mortos-Vivos, uma refilmagem quase que absoluta do original, até mesmo pelo uso de desenhos que copiam feições dos atores do filme de 1968.
A mesma pergunta feita para o remake de Psicose, de Gus Van Sant, você pode fazer aqui: para quê? Quando você percebe que os lentíssimos – mais que os zumbis – créditos finais apontam o envolvimento de mais de 200 pessoas, você torna a perguntar: para quê? Se o resultado consiste numa animação mal feita em que os personagens parecem saltar em seus movimentos artificiais, você levanta novamente a questão. Um exercício cinematográfico talvez? Um trabalho de conclusão de curso de cinema? Parece, por fim, que ele fora concebido por uns cinco adolescentes numa tarde de domingo, entre muita cerveja e palavrões, enquanto trabalhavam despreocupadamente com programas de uso gratuito de criação de animações em vídeo.
Mas não foi. Trata-se de uma produção com distribuição da Warner Brothers Home Entertainment, que conseguiu ainda a dublagem de um elenco conhecido composto por, entre outros, Josh Duhamel (da franquia Transformers, de filmes como Esta é Sua Morte e Turistas), (Dulé Hill, Reféns do Mal) e Katharine Isabelle (da franquia Possuída). Talvez impressione com o mesmo grau que afetou as pessoas em 1968 quando viram o filme de Romero pela primeira vez, mas de uma maneira oposta: como, depois de mais de cinquenta anos, ainda pode existir uma animação tosca, com aspecto independente, inferior a qualquer desenho exibido nos canais a cabo do Cartoon Network, Discovery Kids ou Gloobinho?
O enredo você já cansou de saber qual é. John (Jimmi Simpson) e sua irmã Barbara (Isabelle) estão visitando o túmulo do pai em um cemitério na Pensilvânia. Enquanto provoca a irmã (“Eles estão vindo pegar você, Barbara.“), o rapaz não percebe a aproximação de um homem trôpego. Na luta corporal, John bate a cabeça numa tumba e morre, com a animação vertendo sangue pelos olhos e nariz dele, e Barbara e perseguida até seu veículo. Sem as chaves, com o morto-vivo usando uma pedra para quebrar a janela, ela solta o freio de mão e consegue se afastar o suficiente para buscar abrigo numa residência rural. Pouco depois, chega ao local Ben (Hill), que tenta proteger a casa com madeiras e afastar os mortos com fogo.
Em uma cena que não existe no filme original, ele narra para Barbara como chegara até ali. O que necessita da imaginação do espectador no original aqui é mostrada, com o rapaz vendo um caminhão explodir e os mortos continuarem se movimentando. Barbara fica atônita, em choque, enquanto Ben protege as janelas e portas e incendeia um sofá na entrada. Depois que liga o rádio e ouve evidências de que aquilo está acontecendo em todo lugar, Ben sobe para fechar o lado superior no momento em que Harry Cooper (Duhamel) surge do porão. Ele está no local com a esposa Helen (Nancy Travis) e a filha moribunda Karen (Ashley Lambert), além do casal jovem Tom (James Roday Rodriguez) e Judy (Katee Sackhoff).
Tal qual o original, Harry se mostra insuportável e insensível, sugerindo a todo momento que todos se protejam no porão. Ele briga o tempo todo com Ben, e até arranca dele a espingarda encontrada, para trazer mais lutas corporais. A ideia de buscar combustível para um veículo termina com a morte de Tom e Judy, em uma sequência levemente diferente do original. Aos poucos, os mortos – chamados ghouls – ocuparão toda a região, circundando a casa para destruir as passagens. Ben precisará de paciência para confrontar os horrores externos e a ação insana de um Harry egoísta.
A animação mergulha a tela de tons vermelhos, apesar de sua deficiência técnica. Há cenas de desmembramentos, rostos com partes do crânio à mostra, corpos incendiados e olhos vazados, sem impressionar muito pelos excessos. A direção de Jason Axinn é simples, sem nada de especial, até porque muitos dos posicionamentos de imagens são idênticos ao do filme original. O filme é curto, tem apenas 70 minutos, considerando os lentos créditos finais para deixar de ser um média-metragem. Assim, muito das cenas tensas e dramáticas do filme de 68 são substituídas por mais movimentação e luta pela sobrevivência no ambiente claustrofóbico. O problema é que diminui a raiva que o espectador poderia sentir por Harry, muito mais odiado nas versões de 1968 e 1990.
Ao final, depois de rever a trama desenvolvida por Romero de maneira “animada“, é bem provável que o público fique em um estado de catatonia e incredulidade como Barbara, questionando as razões para essa animação ter sido feita.
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